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Poemas de Fernando Pessoa

Todos os melhores poemas de Fernando Pessoa e Heterónimos. Amor, amizade, paixão e vida em todos os poemas.

Poemas de Fernando Pessoa

Todos os melhores poemas de Fernando Pessoa e Heterónimos. Amor, amizade, paixão e vida em todos os poemas.

O Guardador de Rebanhos - XVIII

Quem me dera que eu fosse o pó da estrada

E que os pés dos pobres me estivessem pisando...

 

Quem me dera que eu fosse os rios que correm

E que as lavadeiras estivessem à minha beira...

 

Quem me dera que eu fosse os choupos à margem do rio

E tivesse só o céu por cima e a água por baixo...

 

Quem me dera que eu fosse o burro do moleiro

E que ele me batesse e me estimasse...

 

Antes isso que ser o que atravessa a vida

Olhando para trás de si e tendo pena...

O Guardador de Rebanhos - XVI

Quem me dera que a minha vida fosse um carro de bois

Que vem a chiar, manhaninha cedo, pela estrada,

E que para de onde veio volta depois

Quase à noitinha pela mesma estrada.

 

Eu não tinha que ter esperanças — tinha só que ter rodas...

A minha velhice não tinha rugas nem cabelo branco...

Quando eu já não servia, tiravam-me as rodas

E eu ficava virado e partido no fundo de um barranco.

 

Ou então faziam de mim qualquer coisa diferente

E eu não sabia nada do que de mim faziam...

Mas eu não sou um carro, sou diferente

Mas em que sou realmente diferente nunca me diriam.

O Guardador de Rebanhos - XV

As quatro canções que seguem

Separam-se de tudo o que eu penso,

Mentem a tudo o que eu sinto,

São do contrário do que eu sou...

 

Escrevi-as estando doente

E por isso elas são naturais

E concordam com aquilo que sinto,

Concordam com aquilo com que não concordam...

Estando doente devo pensar o contrário

Do que penso quando estou são.

(Senão não estaria doente),

Devo sentir o contrário do que sinto

Quando sou eu na saúde,

Devo mentir à minha natureza

De criatura que sente de certa maneira…

Devo ser todo doente — ideias e tudo.

Quando estou doente, não estou doente para outra coisa.

 

Por isso essas canções que me renegam

Não são capazes de me renegar

E são a paisagem da minha alma de noite,

A mesma ao contrário...

O Guardador de Rebanhos - XIV

Não me importo com as rimas. Raras vezes

Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.

Penso e escrevo como as flores têm cor

Mas com menos perfeição no meu modo de exprimir-me

Porque me falta a simplicidade divina

De ser todo só o meu exterior.

 

Olho e comovo-me,

Comovo-me como a água corre quando o chão é inclinado,

E a minha poesia é natural como o levantar-se o vento...

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